Fui crescendo mais ou menos com a noção empírica de que os filhos seriam o reflexo dos pais, ainda que estes, por vezes, não o pretendessem.
No ano de 2009, ao encontrar-me num parque público no concelho de Oeiras, tive a oportunidade de presenciar o seguinte quadro:
um alegado pai munido de uma bola oficial de futebol de 11, uns pinos e um apito, ministrava um “treino ao estilo militar” a duas crianças, com idades inferiores a 9 anos.
Este exercício raiava o absurdo. O alegado pai, com um ar à “Jorge Jesus” no decorrer de um jogo, gritava, gesticulava e exigia que os miúdos executassem diversas situações de jogo de acordo com as suas instruções, não se coibindo, a cada falha dos petizes, de os obrigar a fazer séries de abdominais e flexões.
As crianças, equipadas a rigor e com penteados à CR7, obedeciam de modo fervoroso e infantil, a cada ordem emanada do adulto, sendo evidente que o esforço produzido não era adequado às suas idades.
Ora, este adulto, certamente na casa dos seus quarenta anos é o que eu apelido como um “Bárbaro Lusitano”, doravante denominado por “BL”.
Dito isto e penetrando na psique do BL, o que o levará de apito na boca a agir deste modo, prestando-se a uma figura ridícula e irresponsável?
A resposta radica no modo como o BL, nascido na década de 70 do século passado, viveu a sua vida até aqui.
O BL, por impossibilidade ou não, não logrou que o seu agregado familiar fizesse parte da cada vez mais rara classe média estável, estando desempregado ou ocupado num trabalho que não o realiza.
E tem a firme convicção que os filhos só poderão ser diferentes dele, se não forem o seu reflexo.
Assim sendo, julga que os problemas futuros dos seus petizes, e ou os seus, podem ser resolvidos com o ascensor sócio-económico futebolístico, tão propalado pelos media nos tempos que correm.
O BL não quer ou não acredita que os seus filhos possam ser no futuro juízes ou competentes canalizadores, ele quer que, pelo menos, um seja profissional de futebol e investe nisso o seu tempo.
O BL não sabe ou não quer saber que o futebol, enquanto profissão é um sorvedouro de potenciais canalizadores ou médicos competentes e bem sucedidos.
E por fim, o BL está-se marimbando para a noção básica de que qualquer desporto se aprende a brincar e por vontade própria dos sujeitos da brincadeira.
No momento certo, não tenho dúvidas, que serão os próprios petizes a apelidar o pai de Bárbaro Lusitano, ou de qualquer outro vocábulo menos abonatório…
RMPC para Up To Lisbon Kids